Fernando Schuler: Ponto a ponto na BandNewsTV

O cientista político Fernando Schüler, entrevistado do Ponto a Ponto na BandNewsTV, debateu sobre o governo Temer e o cenário político no programa “A crise em movimento”.
Fernando Schuler: “As pessoas sabem que a administração do Central Park é privada?”

O cientista político e professor do Insper Fernando Schüler falou ao Estado da Arte sobre o resultado das eleições municipais de 2016. Este é o momento de pensar na boa gestão que o setor público pode e deve oferecer à sociedade. Diante das críticas a propostas de modernização na administração municipal, Schüler questiona: “Será que as pessoas sabem que o Central Park, em Nova York, é gerido por uma organização privada? Que o mesmo acontece com o sistema de bibliotecas públicas da Big Apple, que funciona perfeitamente bem?”. Leia mais Originalmente publicado no Estadão/Estado da Arte em 07/10/16
Entrevista Na Real: “Fernando Schuler: o maior risco é ficar tudo como está”

Em busca de melhor compreensão da atual conjuntura e os possíveis cenários pós-julgamento do TSE, o programa na Real Na TV desta semana entrevistou o cientista político Fernando Schuler, professor do Insper. Clique aqui para assistir ao programa na íntegra
Entrevista Um Brasil: “Sociedade busca líderes fora da política tradicional”, diz Fernando Schüler

As investigações sobre corrupção envolvendo políticos e grandes empresas estão pondo em xeque o modelo de democracia que o Brasil escolheu quando promulgou a sua última Constituição, em 1988. Com isso, nomes não associados à política tradicional têm ganhado espaço e confiança da população para liderar o País, de acordo com o cientista político e curador do projeto Fronteiras do Pensamento, Fernando Schüler. Em entrevista ao UM BRASIL, realizada em parceria com o InfoMoney, Schüler diz que o financiamento empresarial de campanha eleitoral se mostrou um mecanismo que não trouxe benefícios à sociedade. “Em um sistema como esse, com financiamento empresarial de campanha, você induz os políticos a pedirem recursos para os empresários, evidentemente estabelecendo inúmeras trocas e negociações. O resultado não poderia ser bom. Tivemos três décadas com esse modelo e, agora, estamos passando a limpo”, diz Schüler, que também é professor do Insper. De acordo com ele, não só o Brasil, mas o mundo vive uma tendência de buscar líderes que não estão associados à política tradicional, como o prefeito de São Paulo, João Doria, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e alguns dos principais candidatos que disputam a eleição presidencial na França. Em razão das denúncias de corrupção e da crise de representatividade da sociedade em relação aos políticos, a discussão sobre a reforma política ganhou destaque nos últimos anos. Segundo Schüler, apesar desses problemas, a solução para a questão do financiamento de campanhas não deve ser encontrada no “afogadilho”. “Minha sugestão, acho que me parece mais razoável, é esperar um novo Congresso, uma nova liderança para o País e jogar esse debate para a sociedade”, afirma. Schüler também diz que os partidos políticos precisam entender que a população não vive no mundo ideologizado pregado por acadêmicos e, dessa forma, o debate não deve mais se tratar sobre se as ações são de direita ou de esquerda. Para as próximas eleições, o cientista político acredita que a sociedade tende a apoiar candidatos de posicionamento mais ao centro e menos marcados pela forma tradicional de se fazer política no País. “Duvido que a sociedade vai optar por uma liderança radicalizada. Um candidato que se apresente mais ao centro terá, em tese, mais aceitação”, diz. Clique aqui para assistir a entrevista na íntegra
Entrevista O Livre: “Não existe reforma da previdência com apoio popular”

Crise econômica sem precedentes. Um governo com baixa popularidade e sérias pendências na Justiça Eleitoral. Pessoas engalfinhando-se nas redes sociais pelos mais variados motivos. Políticos e empresários do primeiro escalão a engrossar as estatísticas do sistema carcerário. Motivos não faltam para enxergar o caos no Brasil de 2017. E é justamente em cenários assim, de posições extremadas, que o papel do intelectual e do analista político se torna ainda mais necessário. É o que afirma o cientista político, professor e doutor em filosofia Fernando Schuler, novo colaborador do LIVRE. Segundo ele, em tempos de “pós-verdade”, fatores como racionalidade, bom senso e estatísticas confiáveis nunca foram tão necessários. “Uma das primeiras tarefas do analista político é separar a sensação de caos do caos verdadeiro. Nós temos a impressão, por exemplo, de que a violência está aumentando, mas os dados mostram que ela vem caindo historicamente, com oscilações”, diz. Gaúcho, ex-secretário de Justiça e Desenvolvimento Social do governo do Rio Grande do Sul, Schuler vê em sua terra natal um exemplo claro da necessidade das polêmicas reformas propostas pelo governo de Michel Temer. “Hoje há incerteza no cenário político em relação a uma reforma que é absolutamente vital, inclusive para a manutenção dos direitos sociais, para que o Brasil não vire um Rio de Janeiro, um Rio Grande do Sul”, afirma. Sobre a impopularidade das medidas, especialmente em relação à Previdência, Schuler afirma que nunca esperou um contexto diferente. “Nunca se fez reforma da previdência com amplo consenso e sem uma boa dose de conflito social”. O país entra em 2017 com um presidente impopular e sob risco de cassação em meio à discussão de reformas polêmicas e crise econômica. É possível enxergar alguma luz no horizonte? O Brasil vive uma situação paradoxal. Temos boas e más notícias. Existem dois processos andando, paralelamente. Por um lado, uma agenda econômica de reformas sendo conduzida com grande dificuldade, que é basicamente o ajuste fiscal que o governo vem fazendo, a PEC que limita o gasto público, a reforma da Previdência, a reforma trabalhista e a liberação das terceirizações. São reformas importantes para a modernização da economia, que vão permitir mais agilidade e dinamismo para a gestão empresarial e beneficiar as pequenas empresas. A longo prazo, isso trará maior sustentabilidade fiscal, permitindo que o governo cumpra as suas obrigações sociais e faça investimentos. Estamos assistindo a uma ampliação do modelo de parcerias público privadas, como esse recente leilão de quatro aeroportos, mostrando que o Brasil recuperou um certo padrão de credibilidade internacional. O leilão apresentou um ágio muito significativo. O aeroporto de Porto Alegre chegou a 800% de sobrevalorização. Existem notícias positivas, ou seja: o governo vem acertando na área econômica. E o que seriam as más notícias, na sua opinião? O grande teste vem agora, com a reforma da Previdência. O governo foi bem-sucedido na PEC do controle de gastos públicos, mas precisa mostrar força agora na Previdência, pois o desafio é muito maior. São necessários 308 votos. É um tema delicado e que mexe com expectativas de milhões de pessoas. Os deputados sofrem pressão nas bases e as eleições são no ano que vem. E o governo vem recuando. Primeiro, em relação aos militares. Depois, as polícias militares e os bombeiros. Agora, os servidores estaduais e municipais. A pergunta que se faz hoje é: até onde o governo vai recuar? Existem vários pontos de dúvida: vai recuar sobre a igualdade entre homens e mulheres? Vai recuar no tema da assistência social? Vai recuar na idade mínima de 65 anos e flexibilizar as regras de transição? São perguntas no ar. Hoje diria que é muito difícil aprovar a reforma. O resultado da votação da lei de terceirizações mostrou que o governo tem uma certa dificuldade. Como não era uma Emenda Constitucional, mas uma lei ordinária, o governo conseguiu 231 votos, o que é muito distante dos 308 necessários para uma PEC. Há incerteza no cenário político em relação a uma reforma que é vital para a manutenção dos direitos sociais, a longo prazo. No fundo, estamos decidindo hoje se vamos assegurar para as próximas gerações os direitos inscritos na Constituição. Já houve manifestações significativas nas ruas e, em especial, nas redes sociais, com duras críticas às reformas propostas. Como o governo está se saindo na chamada batalha da comunicação? Ninguém imaginava que fosse possível aprovar uma reforma da Previdência com amplo apoio social. As pessoas não pensam com esse nível de racionalidade. Nenhum país do mundo fez reformas desse tipo com amplo consenso e sem uma boa dose de conflito social. E aí tem um lado positivo do governo Temer: talvez fosse necessário um governo impopular para fazer as reformas. Um governo preocupado com popularidade, às vésperas da eleição, jamais faria isso. O presidente Temer não tem expectativas eleitorais. Sabe que é um presidente impopular. A missão dele é com a história. E como avalia o desempenho do presidente nesta tarefa? Temer pensa no legado. É um homem de certa idade, faz um governo de transição que nasce de um impeachment, mas pode deixar um legado ao país, ao ajustar a economia e recuperar a credibilidade externa. A taxa de risco do país vem caindo e chegou ao nível pré-crise. A Petrobras recuperou uma parte do seu prestígio internacional, as ações recuperaram boa parte do valor, e o governo vem desempenhando bem o seu papel. O ponto é que o governo não tem como ganhar a guerra da comunicação. Não pode alimentar essa expectativa, pois não há como ganhar. O que o governo pode fazer é o que os cientistas políticos chamam de controle de dano, ou seja, não deixar que a oposição conquiste as ruas. Isso o governo vem conseguindo fazer, pois as manifestações contrárias à reforma da previdência ainda são basicamente restritas à militância sindical e partidária, setores do funcionalismo público e redes sociais. Mas não ganhou um contorno popular. Não há manifestações de massa. Enquanto isso não acontece, o governo vem lidando bem com o problema. Mas, para além das
El Caballo e a sedução das grandes palavras

(artigo publicado na Revista Época, em novembro de 2016, por Fernando Luís Schüler) “No futuro, todos que não forem partidários de Fidel, serão acusados de imoralidade”, escreveu o cronista Miguel Bauza, em um artigo publicado no jornal Bohemia, em dezembro de 1955. À época, Fidel achava-se na cidade do México, preparando o desembarque guerrilheiro na Ilha, e ainda havia imprensa circulando livremente pela Ilha de Cuba. Não demorou muito para que a profecia de Bauza se fizesse história. Infinitas histórias. Uma delas foi a de Mario Chanes, morto em 2007, no exílio. Mário desembarcou com Fidel a bordo do Gramna e lutou na Sierra Maestra. Acreditava na promessa de uma democracia para Cuba. Ainda em 1959, divergiu dos rumos da revolução, foi condenado e encarcerado por 31 anos, tornando-se o preso político mais longevo do mundo. Outra foi a história de Pedro Boitel, a jovem promessa da revolução, que em 1960 ousou se candidatar a uma posição na federação universitária de Cuba, contra a orientação de Castro. Encarcerado, condenado a 30 anos de prisão, morreu em 1971, depois de uma greve de fome de 53 dias, com a mãe, antiga conhecida de Fidel, em vigília ao lado do presídio de Castilho del Príncipe, em Havana. Pedro e Mário não cometeram crime algum. Eram mesmo revolucionários de primeira hora. Mas cometeram, como muitos cubanos, nestes 58 anos, o grande pecado anunciado por Bauza. Castro chega ao poder no ano novo de 1959 e lá permanece até sua morte em novembro de 2016. Formalmente, deixou a função de Presidente de Cuba e Chefe das Forças Armadas em 2006, mas manteve o poder em família, até o fim, com seu fidelíssimo irmão Raul. Em qualquer conta que se faça, Fidel foi o mais longevo ditador da era contemporânea, superando mesmo o norte-coreano Kim Il-Sung, que permaneceu por 46 anos no poder. Há algumas unanimidades nos juízos que sobre ele se fazem: a obsessão quase doentia pelo poder, a autoconfiança quase mística, o carisma. Há também controvérsias. A maior de todas seguramente é sobre como foi possível preservar um regime socialista ortodoxo durante todo este tempo, muito além da dissolução do bloco soviético. Há muitas respostas. Carlos Alberto Montaner possivelmente exagere quando diz: pelas mesmas razões que a ditadura da família Kim permanece no poder, na Coréia do Norte. Ok, há algo que ver com isto. Há o aparato repressivo, o sistema do medo. Mas seguramente o tema é mais complexo. Os historiadores terão, doravante, tempo e material suficiente para desvendar o mistério. Fidel é filho de Angel Castro, imigrante galego chegado a Cuba em 1898. Angel foi um self made man cubano. De cortador de Cana, trabalhando para a United Fruit Company, terminou seus dias como um grande proprietário de terras em Birán, ao norte de Cuba. Foi-se aos 80 anos, poucas semanas antes do desembarque do filho rebelde na praia Las Coloradas, a bordo do Gramna. Graças à seu sucesso empresarial, pode oferecer a melhor educação a Fidel, incluindo os anos de ensino intermediário no Colégio de Belém, de orientação jesuíta. Instituição devidamente expulsa da Ilha, depois da revolução. Angel tentou, durante anos, fazer com que o filho abandonasse a política, sem sucesso. Fidel ingressa na Universidade de Havana em 1945, como estudante de direito, e imediatamente mergulha em um ativismo político desenfreado. De estatura elevada, exímio orador, ávido por sucesso, surge como “el caballo”, o bicho das guerras estudantis da Havana dos anos 40. Ora podemos vê-lo embarcando da tentativa de invasão de Santo Domingo; ora discursando, com os olhos vidrados, ao lado da estátua Alma Mater, nas escadarias da Universidade; ora pondo em ação seu faro midiático, como no translado do sino da independência, o Demajagua, para a Universidade de Havana, em novembro de 1947, em uma ação espetacular contra o governo do Presidente Ramon Grau. Data desta época sua conversão ao marxismo. Na virada dos anos 50, torna-se um revolucionário profissional. Deixa que Mirta, sua primeira mulher, viva em um quarto de hotel no centro de Havana, quase sem dinheiro, com o filho pequeno. Mirta depois o abandona. Se casa com um jovem inimigo político de Castro, filho do embaixador de Cuba na ONU. Fidel não lhe perdoará. Anos depois, literalmente, sequestra o filho, Fidelito, para viver na casa de amigos, em seu exílio mexicano. No dia 26 de julho de 1953, à frente de um grupo mal preparado de 160 combatentes, faz sua aposta mais ousada, com a invasão do Quartel de Moncada. A ação termina com 61 mortos, é um fiasco, mas serve para transformar Fidel em um ícone internacional. Recebe um julgamento aberto, e lhe é permitido fazer a própria defesa. Com menos de dois anos de prisão, é anistiado. A tomada do poder, em janeiro de 1959, foi sua obra prima. Na Sierra Maestra, cria o mito dos “barbudos”, jovens idealistas cujo único objetivo era a libertação de Cuba do tirano Fulgêncio Batista, a reconstrução democrática, a convocação de eleições livres. Uma vez no poder, empossou um presidente fantoche, Manuel Urrutia, e em poucos meses suprimiu todas as “retrancas” institucionais que poderiam limitar de algum modo seu poder. Esqueceu-se das eleições, proibiu os partidos políticos, fechou o parlamento, promoveu um amplo expurgo na Universidade de Havana, fuzilou alguns milhares de opositores (fala-se em quatro mil, nos três primeiros anos da revolução, mas as estatísticas são imprecisas). Fechou todos os órgãos de imprensa independentes, incluindo a tradicional revista Bohemia, a os jornais Prensa Libre e o Diário de la Marina, este último fundado em 1832. O “método” era sempre o mesmo: o progrom de estilo fascista, a invasão da redação pela turba militante, a conivência policial, e logo a fuga dos chefes de redação e proprietários para alguma embaixada próxima. Foram os anos de ouro do panóptico sinistro da Ilha de Pinos, o presídio modelo que abrigava, no início dos anos 60, mais de oito mil presos políticos. No poder, Castro enuncia a equação demiúrgica que lhe permite prosseguir no comando da Ilha, indefinidamente: “a
“A esquerda precisa fazer as pazes com a economia e a democracia”

Artigo originalmente publicado na revista Época Demétrio Magnoli escreveu um artigo, dias desses, sugerindo que a presidente Dilma aproveite o tempo livre pós- impeachment para refletir sobre seus erros. A sugestão é boa. A primavera logo chega, e nada melhor do que pedalar à beira do Guaíba, em Porto Alegre, refletindo sobre os próprios equívocos. Já fiz coisa parecida, confesso, no pior do inverno gaúcho. Não creio, porém, que Dilma fará nada disso. É uma mulher de muitas certezas, como aliás parecem ser as pessoas que a cercam. Pessoas que lhe entregam flores, por onde chega, que carregam sua imagem de guerrilheira, ainda jovem, à frente de um inquérito militar. E tem o Chico a lhe dar razão, não é mesmo? Por que ela faria autocrítica? Alguém que resistiu à tortura e superou uma doença difícil? Nem pensar. Se alguma coisa deu errada no seu governo, não foi culpa dela. Seu novo mantra já está definido: voltaremos. Dilma voltará como um personagem secundário nos livros de história. Na política real, é carta fora do baralho. A questão que me parece relevante diz respeito ao destino do PT. O partido prosseguirá relevante na política brasileira? Ninguém tem boa de cristal para saber se Lula irá ou não sobreviver à Lava Jato. Lula tenta derrotar a justiça e o Juiz Sérgio Moro fazendo política. É possível que vença a parada. Se vencer, o PT ainda terá o maior líder político do País. Se perder, o PT sofrerá uma diáspora de quadros, mas ainda será um partido relevante no contexto da esquerda brasileira. A pergunta correta a fazer, é: O PT reconhecerá os seus erros? De um modo mais amplo, a esquerda brasileira é capaz de revisar posições e se reinventar? Ok, estamos muito em cima dos fatos, há cicatrizes, ninguém gosta de perder o poder assim desse jeito. A turma quebrou umas paradas de ônibus, na Paulista, depredou a sede do PMDB, em Porto Alegre, chamou todo mundo de golpista, canalhas e outras mesmices. Mas depois que a raiva passar, a esquerda vai mudar o disco e fazer uma autocrítica? Será capaz de se reinventar? Acho que isto seria ótimo para a própria esquerda, para o PT, e principalmente para nossa democracia. Mas não acredito, infelizmente. Estamos falando de pessoas treinadas para entender a verdade como um “campo de luta”. Como coisa que se “constrói”. Falamos de gente que anda do lado certo da história, para quem a dúvida é uma forma por vezes sutis de traição. De qualquer modo, me arrisco a dar algumas sugestões. Uma delas é o pessoal aproveitar o tempo livre e prestar atenção a coisas novas que andam sendo ditas neste Brasil cansado de passado. Uma delas li em um belo artigo do Professor Celso de Barros, do IPEA, dias atrás. Sua tese é a de que o PT e a esquerda devem fazer as pazes com a economia. Se a ideia é dar a volta por cima e algum dia voltar ao poder, é preciso que a esquerda faça uma ampla revisão de sua visão sobre a economia de mercado e como se nela se encaixa os interesses dos mais pobres. Barros parece acreditar que é possível abrir a cabeça da esquerda. Convence-la de que não é a negação da racionalidade econômica que define o sentido de uma esquerda contemporânea. Que ela se define justamente por compatibilizar a racionalidade econômica com políticas de “distribuição de renda e oportunidades”. Barros sugere uma visão “agnóstica” sobre política econômica: “o que funcionar, funcionou”. Diz que responsabilidade fiscal deveria ser um valor especialmente caro para quem quer um estado forte e ativo. Sugere abandonar a aversão congênita à privatização e outras bobagens. Como a ideia de achar que toda política de austeridade é sempre contra os mais pobres, ou que todo aumento de juros é sempre uma concessão ao “rentismo”. A tentativa de sofisticar um pouco a esquerda é generosa, mas não imagino que produza resultados. Não consigo imaginar um congresso do PT aprovando resoluções sobre “manter o equilíbrio das contas públicas, corrigir o déficit estrutural da previdência, oferecer previsibilidade ao mercado, inflação no centro da meta” e coisas assim. Seria ótimo para nossa democracia ter uma esquerda desse calibre. Em alguma medida, ela existe, muito tímida, espalhada pelo PSDB, PMDB, PPS, PSB, REDE. O ponto é que ela é minoritária no petismo e seus aliados. Ideias desse tipo estiveram presentes na equipe econômica do Ministro Palocci, no primeiro governo Lula. Equipe de alto padrão, afinada com o que se poderia esperar de uma esquerda moderna. O ponto é que vivíamos uma época especial. Um ciclo de expansão da economia global, boom das commodites, com os frutos de um País que havia passado pelo ciclo de reformas dos anos 90. O PT e sua base sindical toparia uma política de rigor fiscal em tempos difíceis? As evidências não parecem favorecer muito esta hipótese. Se a esquerda quiser de fato se reinventar, dou uma sugestão: invistam algum tempo, de cabeça aberta, observando a experiência internacional. Vejam onde isto aconteceu. Há exemplos por toda parte. Em todos eles há o elemento “agnóstico”. A capacidade de dar um chega pra lá na ortodoxia e observar o mundo a partir de dados, evidências e boa dose de bom senso. Observem, por exemplo, o que aconteceu com a esquerda chilena, sob a liderança de Ricardo Lagos e sua Concertación. Lagos consolidou a democracia chilena ao mesmo tempo que soube preservar as conquistas da liberalização econômica, tornando o Chile um raro caso de sucesso econômico na América Latina; observem Vaclav Ravel, o poeta-estadista do Lanterna Mágica, no coração de Praga, com sua revolução de veludo e a formação da República Tcheca; observem ainda Mandela e sua imensa capacidade de esquecer. De construir consensos onde só se imaginava lugar para o de revanchismo. E de mudar, adotando uma visão liberal da economia que ajudou a África do Sul a crescer aceleradamente nos anos pós-apartheid. Acertar as contas com a economia, porém, é a apenas uma parte
História e sociologia na nova base curricular: ideologia e confusão

Artigo publicado originalmente na revista Época Responda rápido: se você não quiser resolver muita coisa, mas fazer uma boa discussão, por onde deve começar? Há muitas respostas para esta pergunta. A minha favorita é: fazendo um mau diagnóstico. Ok, a resposta é meio óbvia, mas é exatamente disso que se trata o debate travado no País em torno da nova “base nacional comum curricular”. Pra quem não está familiarizado com o tema, trata-se de implantar um currículo obrigatório comum para todas as escolas brasileiras, estatais ou privadas, de ensino médio e fundamental. Na prática, uma lista de conteúdos para disciplinar o ensino básico. Orientar os autores de livros didáticos, o trabalho dos professores, em sala de aula e as provas do ENEM. Meu argumento: a proposta de uma base curricular comum parte de um diagnóstico errado. Ela diz que que há um problema com nossa educação básica e que a implantação de um currículo nacional é fundamental para reduzir nossas “desigualdades educacionais”. Isto está lá, na primeira frase do site do “Movimento pela base nacional comum”. Os dados são conhecidos: o Brasil possui 190 mil escolas voltadas ao ensino básico. Perto de 80% tem gestão governamental. No ensino médio, alcançam 3,4, em média, no IDEB. A rede privada, por sua vez, tem um IDEB de 5,4. A discrepância se repete no PISA: alunos de escolas privada alcançam uma média pouco acima de 500; alunos de escolas públicas ficam perto do último lugar, com média de 387. Observando estes dados, alguém poderia desconfiar que há um problema com a educação estatal, no Brasil. Desconfiar que há um problema com o alto absenteísmo de professores na rede pública (estudo mostrou que 12 mil professores faltam à aula todos os dias na rede estadual paulista); com a burocracia da gestão governamental, as amarras da lei das licitações, a estabilidade no emprego dos professores, a precariedade das instalações, a falta de continuidade administrativa, a pressão sindical contra qualquer inovação e meritocracia, as greves em série, et, etc. Alguém podia ter pensado nestas coisas, mas ninguém pensou. No cânone do debate educacional brasileiro, pode-se chegar a qualquer conclusão, menos que exista algum problema como o modelo de gestão estatal de nossas escolas. Questionar o “modelo” gera, como me disse certa vez a dirigente de uma ONG voltada à educação, um “problema político”. E ninguém quer encarar um problema politico, não é mesmo? Uma vez decidido não enfrentar o cânone, produziu-se um singular diagnóstico: o que está faltando na nossa educação é uma lista de conteúdos que as escolas devem ensinar. Tenho curiosidade de saber que tipo de evidência empírica se usou para se chegar a essa conclusão. Suspeito que nenhuma. Talvez apenas a velha ideia de que é preciso “centralizar” quando alguma coisa não está funcionando. Pois bem, feito o diagnóstico, o governo brasileiro partiu para a elaboração da lista. O MEC formou uma comissão de 116 professores e pôs mãos à obra. Depois de algumas revisões, publicou uma última versão da lista de conteúdos no mês de maio. Relutei, confesso, em analisar o seu conteúdo, pelas razões expostas acima. Mas fui em frente. Me concentrei nas áreas de história e sociologia. Li e reli a lista de conteúdos, e confesso que me surpreendi. Ela é muito pior, mais confusa e mais pesadamente carregada de viés ideológico do que havia imaginado. O viés ideológico da base comum surge com nitidez na área de sociologia. Nos 28 conteúdos sugeridos, o arco conceitual é feito de palavras chaves como “classes sociais”, “dominação”, “divisão social do trabalho”, “relações sociais de produção”, “movimentos sociais”. Não há, em toda lista, uma única menção a conceitos como liberdade, ética, indivíduo, direitos individuais, mercado, tecnologia ou inovação. Nada sobre a sociedade pós-industrial, de Daniel Bell; sobre a sociedade de rede, de Manuel Castells; ou a sociedade aberta, de Karl Popper. Alguém diria que estes são temas “difíceis”? Não acho. Não é a dificuldade que separa a boa sociologia do proselitismo. A lista consagra uma visão binária de sociedade, baseada em polarizações de “classe” e movimentos sociais. Linha já adotada em nossos livros didáticos de sociologia. A novidade é que agora ela ameaça se tornar visão “oficial” do estado brasileiro. No primeiro ano do ensino médio os alunos aprenderão sobre “localização social, como classes sociais”; No segundo ano refletirão sobre “movimentos sociais baseados em classes sociais e, no terceiro, “problematizarão a divisão de classes no modo de produção capitalista”. No quarto fariam uma revolução, imagino. Brincadeira. A expectativa realista é que passem a integrar algum “movimento social”. Para deixar claro: é razoável que este tipo de conteúdo seja apresentado como uma dentre outras linhas de interpretação sociológica no mundo moderno. Nada razoável, no entanto, é que ele seja apresentado como “a” sociologia como tal. Como pensamento único, travestido de realidade e pronto a fazer a cabeça dos nossos alunos. O que temos aqui é um clássico problema de ação coletiva: quem exatamente é capaz de expressar o “pensamento comum” ou a reflexão sociológica “adequada” para as 190 mil escolas brasileiras? Uma comissão de 116 especialistas escolhida pelo Ministério da Educação? Uma espécie de ágora digital com todo mundo dando palpite na internet? O Conselho Nacional de Educação? O Congresso? O resultado da base curricular, na área da sociologia, ao menos até agora, mostrou apenas o perfeitamente previsível: que a definição dos conteúdos foi “capturada” por um grupo de opinião ideológica muito particular. E ameaça se tornar “opinião oficial” do governo brasileiro. O vezo ideológico se repete na área de história, apenas de maneira mais confusa. Depois de ler e reler os 56 itens sugeridos para os três anos do ensino médio, confesso que tudo me pareceu uma bricolagem de conteúdos “multiculturais”. Tentativa de compor algo como uma “história étnica”, livre de linhas de tempo, feita de distintas “temporalidades” africanas, ameríndias, europeias ou asiáticas. A ideia, aparentemente, é retirar da civilização “ocidental” ou “europeia” qualquer “primazia” no estudo da história. O estudo do império brasileiro teria o mesmo status que tem o estudo
Faz sentido ser apaixonado por um partido político?

Publicado originalmente na Revista Época O apaixonado é frequentemente um tolo, ensinou Roland Barthes. Barthes se referia à paixão amorosa. A paixão louca dos amantes, dos namorados. Dos amores eternos e dos impossíveis, desses que a gente vê nos filmes. Não faço ideia do que Barthes diria de um sujeito apaixonado por um partido político. Ou pior: por um político de carne e osso. Um prefeito, governador, presidente ou ex-Presidente. De minha parte, teria um bom nome a dar a esse sujeito, que prefiro não usar aqui. Digo apenas que acho o passionalismo partidário um tanto ridículo, ainda que eficiente para quem dele se aproveita para chegar – ou se manter – no poder. Sobre isso, tive uma experiência interessante, dias atrás. Escrevi um artigo a respeito das investigações sobre Lula. Havia me impressionado a reação apaixonada e violenta da entourage lulista contra as investigações do Ministério Público e da Política Federal, e resolvi escrever sobre o assunto. Meu ponto era apenas dizer que o país tem instituições, que é importante que elas possam agir com serenidade, e que Lula deve der investigado como o seria qualquer outro brasileiro. Que isto era importante, no caso de Lula, precisamente por ele ser, como costumam frisar seus apoiadores, o “mais importante líder político deste país”. Recebi umas 400 mensagens. 30% delas de apoiadores do ex-presidente. 100% furiosas. Não dá pra citar todos os argumentos – diria “fragmentos”, num tom barthesiano – mas a coisa vai por aí: Lula é inocente/Não deve ser investigado/o Ministério Público, Polícia Federal e judiciário são instituições de araque/outros partidos também roubam/a mídia é de direita/querem dar um golpe como fizeram com Jango e JK. Me surpreendeu a inclusão de “JK”. Na faculdade aprendi que o JK era de “direita”. Talvez fosse para dar “amplitude” ao argumento. Mas esse não é o ponto. Gostei das mensagens: pude ampliar minha coleção de fraseologia jus esperniandi. Uma fonte inesgotável de bolinhas de sabão ideológicas, sempre com o mesmo núcleo: a mídia, o golpe, a direita. O que realmente me surpreendeu foi não receber sequer uma única mensagem dizendo: “podem investigar, nós confiamos na honestidade do Lula”. Ou, algo mais sofisticado: “é bom investigar. Lula é nosso líder (entre outras razões) porque é honesto. Se ele não for, ao menos saberemos e poderemos rever algumas posições”. Mas nada. Nem uma mísera mensagem nessa direção. O intrigante seria esta nossa atitude em qualquer tema relevante da nossa vida. A papinha do bebê, por exemplo. Imaginem a mãe dizendo: “ok, há suspeitas de que a papinha que usamos é tóxica, mas não quero saber. Conversa da concorrência, vamos continuar comprando”. Pense. Qualquer assunto: a ração do gato, o colégio das crianças, a erva do chimarrão, a marca do silicone. Você nunca vai escutar a seguinte frase: “vou colocar esse silicone amanhã. A Anvisa diz que a marca é suspeita, mas não quero saber. Confirmei a cirurgia”. A pergunta a fazer é: se não agimos assim com as nossas coisas, então por que tratamos desse jeito nossas escolhas políticas? Por que, diante de informações que não nos agradam, tapamos os ouvidos e cantarolamos, como um criança mimada? Por que, de antemão, em vez de ponderar os fatos, resolvemos que a ração do gatinho é ótima, ainda que denunciada pelo conselho de veterinária? Em vez de prestarmos atenção às investigações do Ministério Público, preferimos entrar na hashtag “lulaeuconfio” e ficar gritando “é tudo uma conspiração da direita!” A questão mais geral é: há alguma “racionalidade” na paixão política? Arrisco dizer que sim. A explicação vai na linha do que o economista americano Anthony Downs chamou de “ignorância racional” do eleitor. A tese diz o seguinte: um vez que o voto de cada indivíduo decide quase nada, numa eleição, não é lógico investir muito tempo buscando – seriamente – informação sobre candidatos, políticas públicas, etc. A alienação não seria uma decisão irracional. Mais: quando o sujeito compra um celular desta ou daquela marca, ele toma 100% da decisão e arca com 100% do custo da sua escolha. Se o treco não funcionar, é ele quem arca com as consequências. Na política é diferente. Se ele escolher errado, todos vão pagar a conta. O custo é socializado, mas ele pode privatizar o benefício de manter sua “coerência”. Inventa uma explicação qualquer e toca a vida pra frente. Tudo isso funciona como um convite à irresponsabilidade. Não deveria ser assim, mas acabamos lidando com a política como lidamos com o futebol. Nos entregamos, xingamos a mãe do juiz, dizemos que está tudo arranjado. Nós sabemos de tudo. Inclusive que “não vai dar nada”, se tudo que dissermos não passar de uma grande besteira. A paixão política é assim, uma forma “saborosa” de alienação. Antes que alguém tenha um chilique, digo que isso ocorre, em maior ou menor grau, com todos os partidos. Democratas, PSDB, PMDB. Até pelo recém-criado “partido da mulher brasileira” deve ter um ou outro apaixonado. Mas o lulo-petismo, vamos convir, é, de longe, o caso mais agudo. Se pudesse sugerir alguma coisa, recomendaria que as pessoas fossem um pouco mais criativas: que se apaixonem por uma grande ideia. A liberdade, por exemplo. Ou a justiça, os direitos humanos. A livre escolha educacional (uma das minhas, reconheço). A filantropia, quem sabe. Mas sempre com um chá de camomila por perto. A política pode ser feita com um sentido de missão e um senso de responsabilidade, como sugeriu Max Weber. O primeiro serve como ímpeto, o segundo como comedimento. Não é uma equação fácil, nestes tempos nervosos, mas é a melhor para a democracia, além de preservar velhas e boas amizades. Daí meu gosto todo especial pela frase de Camus: “se houvesse um partido daqueles que não sabem se têm certeza, eu faria parte dele”.
Fascistas são os outros

Publicado originalmente na Revista Época Dias atrás, o cartunista Chico Caruso, de O Globo, publicou uma charge mostrando um pistoleiro entrando em um saloon, destes de filme de cowboy. Lá de dentro vem a pergunta: bandido ou mocinho? “Pior”, alguém responde: “advogado.” Achei boa a brincadeira, ainda que meio comum. Piada de advogado tem às pencas, por aí. Deve ser a profissão mais zoada do planeta. Perde para os políticos, é verdade, e mais recentemente para os padres e pastores. Naquele dia, o Chico resolveu brincar com os advogados. E foi ecumênico. No Saloon havia políticos para todos os gostos. Do Lula ao Fernando Henrique. São os tempos. No Brasil de hoje, humor tem que ser pluralista. Mas vamos lá: bastou a charge do Chico pra um punhado de blogs “progressistas” esbravejarem que a charge do Chico era – pasmem – fascista. Uma charge fascista! Se a revista Charlie Hebdo fosse brasileira, pensei cá comigo, estava liquidada na primeira piada. Logo me e dei conta que, na cabeça dos blogueiros governistas, os advogados que defendem políticos e empresários metidos na Operação Lava Jato são uma espécie de guardiões da virtude. O bastião de resistência contra o grande golpe orquestrado pelo juiz Sérgio Moro e sua turma, lá de Curitiba. Não é sensacional? O ponto que me chamou a atenção foi a facilidade com que anda se usando, aqui nos trópicos, a palavra “fascista”. Há variações, é verdade. Na reta final da última campanha, Lula comparou Aécio Neves aos “nazistas”. Das profundezas da estatística e de alguma discussão sociológica, havia-se sugerido de que a dependência do bolsa família favorecia o voto governista. Alguém teria, não se sabe de que jeito, dito um absurdo desses… Pois bastou para colar uma suástica na testa do candidato da oposição. Na blogosfera ideológica, fascista virou feijão com arroz. Em geral, a palavrinha é usada como um “dedo na cara”. Qualquer derrapada do politicamente correto, não dá outra. O sujeito toma a palavrinha na testa. Usuário frequente da estratégia é o blogueiro Leonardo Sakamoto. Dia desses, ele denunciou como fascista a plantação de flores e cactos embaixo dos viadutos. Elas atrapalham as “pessoas em situação de rua” que desejam dormir por ali, segundo o blogueiro. As prefeituras andam forradas de fascistas, não há dúvidas. A palavrinha, faça-se justiça, tem saído do mundo cão da blogosfera para áreas mais sofisticadas. Em uma palestra para estudantes de história, em Uberlândia, o historiador Leandro Karnal chamou todos os leitores da Veja de “absolutamente fascistas”. Achei curioso o “absolutamente”. Fiquei imaginando o que seria um leitor “relativamente” fascista. O Karnal acrescentou que o referido leitor, além de fascista, é “tapado em qualquer sentido”. Não acho que Karnal pense isto, de verdade. Acho que apenas quis fazer média com a plateia. E parece ter conseguido. Outro que escorregou na palavrinha foi meu amigo Luiz Felipe Pondé. Em um artigo recente, chamou de fascista a turma politicamente correta que tenta impedir que se acenda um charuto cubano em um barzinho. Nessa aí, até eu dancei. Não tenho nada contra quem fuma um Cohiba, mas não vou gostar se o sujeito vier baforar um do meu lado. Talvez eu mesmo seja um fascista, tenho que ver isso melhor. O fascismo foi uma tragédia histórica bem conhecida. O genocídio na Etiópia, a deportação dos judeus italianos aos campos de concentração, o modelo síntese do estado totalitário. No Brasil, virou um xingamento político. Um sintoma a mais da banalização de nosso debate público, embalado na língua suja das redes sociais. Ninguém foi mais longe no seu uso do que a professora Márcia Tiburi. Seu livro Como conversar com um fascista leva ao estado da arte o estilo “dedo na cara”. Tiburi defende o amor e o diálogo. Sustenta que nossa atitude com o “outro” deveria ser “compreendê-lo, acolhê-lo, amá-lo”. Curiosamente, escreve um livro de 196 páginas chamando o “outro” de fascista. Suspeito que faz isso por saber que não há mesmo muita chance do “outro” comprar o seu livro. Dito tudo isso, não nego que haja muita gente por aí com jeito de fascista. Tempos atrás, circulou nas redes sociais o vídeo de um professor da UFRJ, chamado Mauro Iasi, sugerindo ao proletariado carioca fuzilar a “direita” e os “conservadores”. “Conservadores”, imagino, são o “outro” tiburiano do Professor Iasi, e o máximo de violência revolucionária que consigo imaginar, observando seu discurso sem graça, é uma guerra de travesseiros. A verdade é que nem mesmo o professor Iasi é um fascista. É apenas um falador de besteiras escondido atrás de um emprego público, e da nossa complacência. Muito parecido, diga-se de passagem, com a legião de pregadores de ódio escondidos no anonimato do mundo digital. Ódio há para todos os gostos, mas cada um de seus apóstolos parece concordar com a máxima sartreana: o inferno – no caso, os fascistas – são os outros. Retratos de um tempo de banalidade intelectual da qual só o humor pode nos salvar. Por isso, viva o Chico Caruso!